CONVERSAS INTERCEPTADAS DE EX-DEPUTADO INDICAM INTERFERÊNCIA EM DESMATAMENTO ILEGAL NO AM



Conversas telefônicas do ex-deputado Orlando Cidade foram gravadas com o diretor do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) e mostram que o ex-parlamentar exercia sobre os processos ambientais. Ele é um dos investigados em uma ação de desdobramento, realizado nesta terça-feira (10), da Operação Arquimedes, que investiga fraudes para retirada e exportação de madeiras de áreas preservadas na Amazônia.

Três mandados de busca e apreensão foram cumpridos em Manaus e em Manacapuru. Um dos alvos da operação foi em um apartamento de um condomínio no bairro Parque Dez, Zona Centro-Sul de Manaus, do ex-deputado estadual Orlando Cidade. Ninguém foi encontrado no local.

De acordo com as investigações da Polícia Federal, Orlando é um dos responsáveis por uma cooperativa de piscicultores localizada no município de Manacapuru, a Cooperpeixe, onde também foi cumprido um mandado de busca e apreensão.

Quando era deputado, Orlando Cidade teria, segundo as investigações, participado de um esquema de pagamento de propina para servidores do Ipaam e, assim, teria obtido facilitações em vistorias feitas na cooperativa.

Em conversas telefônicas gravadas com autorização da Justiça, Orlando Cidade, quando ainda era deputado, fala com Fábio Rodrigues Marques, na época diretor jurídico do Ipaam. Fábio foi preso em abril na primeira fase da operação Arquimedes.

Na conversa, o deputado reclama de um relatório feito por dois fiscais ambientais.

Fábio: Oi, deputado.

Orlando: Pô, Fábio, ow...doutor Fábio, eu tô aqui com o doutor Almeida.

Fábio: hum rum..

Orlando: Pô, esse Carlos André e o Ênio deram um parecer sacaneando. Não sei aonde nós vamos chegar. E o Ministério Público pega... vai em cima do laudo dos caras.

Fábio: Mas ei...eu...nós conversamos aqui com o doutor...

Orlando: Sim..

Fábio: E expliquei pra ele que essas exigências que estão pra ser complementadas, elas são objetos de condicionantes e restrições, que podem ser cumpridas nos prazos estabelecidos na vigência da licença. Eu expliquei isso aqui pra ele.

Carlos André Silva e Ênio José Botelho, citados na conversa, também foram presos na primeira fase da operação. Na mesma gravação, ao longo da conversa, o diretor jurídico passa então a orientar como o deputado deve proceder para contra-argumentar as alegações do Ministério Público.

Fábio: Mas se ele der uma lida na lei, tá lá nos artigos... salvo engano lá pelo 23 ou 22, estabelece que as condicionantes e restrições... do 16 pra lá que vai falando das licenças... (emenda)… mande ele dar um foco nessa lei aí, porque a sua atividade, ela é protegida por essa lei.

Orlando: Então tá bom, companheiro.

Fabio: Mas o que o senhor precisar, pode me perturbar...e até o doutor aí.

Orlando: Tá, eu...esses caras aí do Ipaam, na hora que dá mais... pô, tinha como ele colocar nos "finalmentes" isso aí?!

Fabio: Mas não procure entrar nas minúcias nas suas alegações. Procure contemplar que a conclusão diz que o Prad foi contemplado, foi cumprido o Prad. É isso que ele diz. As exigências para que o Prad tenha sua conclusão definitiva, isso pode contemplar dentro da licença.

Orlando: Então...

Fabio: Tá entendendo? Não entre nassas minúcias aí que falta pendência...deixa que o Ministério Público se virar pra lá. Não vamos dar guarida pra, eles não.


O Prad citado na conversa é o Plano de Recuperação de Áreas Degradadas. Uma fiscalização anterior apontou que uma das fazendas de criação de peixes da cooperativa funcionava sem licença ambiental. Além disso, o rompimento de uma barragem de piscicultura da Cooperpeixe, em novembro de 2017, acabou poluindo igarapés e também o Rio Miriti, em Manacapuru.

Por meio de nota, o ex-deputado estadual Orlando Cidade diz que não possui conexão com os fatos ou agentes investigados pela suso mencionada Operação. Ele alega ainda que ainda não possui as informações sobre o processo e que não ofereceu resistência aos procedimentos operados pela Polícia Federal.

Arquimedes

A ação de hoje foi um desdobramento da operação Arquimedes. Em abril de 2019, 26 pessoas foram presas suspeitas de envolvimento em fraudes para a exploração ilegal de madeira em áreas preservadas na amazônia. Mais de 100 mandados de busca e apreensão foram cumpridos em oito estados e no distrito federal.

A operação foi iniciada a partir de alerta emitido pela Receita Federal e Ibama, em 2017, ao verificar aumento incomum do trânsito de madeira pelo Porto Chibatão, em Manaus.

A segunda fase da operação foi realizada em abril deste ano. Na ocasião, um ex-superintendente do Ibama foi preso durante a ação. Ao todo, foram 26 pessoas presas e 109 mandados de busca e apreensão em oito estados e no Distrito Federal.

Os suspeitos presos na primeira fase, segundo as investigações do Ministério Público Federal, participavam de uma "espécie" de balcão de negócios para exploração ilegal de madeiras, que eram retiradas de áreas de proteção ambiental por meio de planos de manejo fraudulentos.

A operação investiga a corrupção entre servidores de um órgão ambiental estadual, engenheiros florestais, detentores de planos de manejo e proprietários de empresas madeireiras.

A PF atua em duas principais frentes de investigação criminal por meio de dois inquéritos policiais: a primeira, sobre a extração, exploração e comércio ilegais de madeira, e a segunda, sobre a corrupção entre servidores de órgão ambiental estadual, engenheiros ambientais, detentores de planos de manejo e proprietários de empresas madeireiras.

*Por G1

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